Crónica de Alice Vieira | Vila Museu

Alice Vieira

Vila Museu
Por Alice Vieira

 

Estive nesta 5.ª feira em Óbidos. Já nem sei há quantos anos lá não ia. Mas felizmente está igual ao que sempre foi.

Envolvida pela muralha, lá estão as casas pequenas, as ruas por onde não podem passar carros, e a ginjinha em copo de chocolate, a ser vendida quase casa sim, casa sim…

Fui lá inaugurar uma grande exposição sobre estes meus 45 anos de vida literária, organizada pela autarquia. Fotografias, livros, está lá tudo— e pode ser visitada até fim de Maio.

Eu gosto muito de Óbidos — mas não seria capaz de lá viver… Lojas e mais lojas, cafés a seguir a cafés, cheia de gente sempre a atafulhar as suas ruas estreitas, até temos de pedir licença para passarmos à frente de alguém.

Mas houve alguém que conseguiu. Chamava-se Luisa Satanela, e dirigia a estalagem que ficava no alto da vila.

Quando eu era nova, sempre que lá ia, subia até à estalagem para estar com ela.

Era um prazer estar ali e falar com a Luisa Satanela.

De ascendência italiana, era uma grande actriz, das maiores do seu tempo. Casada durante muitos anos com o também grande actor Estêvão Amarante, eram a dupla de maior sucesso nesse tempo. Quando decidiu deixar o teatro, enfiou-se na estalagem de Óbidos e nunca mais de lá saiu — até morrer, com perto de 80 anos. Lembro-me dela sempre muito bem vestida, muito bem penteada — uma grande actriz em tudo o que fazia.

Então e não é que ontem, quando falei dela, ninguém sabia quem ela era? A não ser o Presidente da Câmara e o director do Museu, as pessoas olhavam para mim como se eu estivesse a falar de algum ET… (E para eles estava). O Museu chama-se José Saramago, porque, segundo lá me disseram, ele fala muito bem sobre Óbidos no seu livro “Viagem por Portugal”. E quem não fala?  Não teria sido bem melhor terem-lhe chamado Museu Luisa Satanela?

Quando puderem, dêem um salto a Óbidos. Como não é para lá ficarem a viver, é o melhor lugar para refrescarem a vista.


Alice Vieira


Alice Vieira
Trabalhou no “Diário de Lisboa”, no“Diário Popular” e “Diário de Notícias”, na revista “Activa” e no “Jornal de Notícias”.
Atualmente colabora com a revista “Audácia”, e com o “Jornal de Mafra”.
Publica também poesia, sendo considerada uma das mais importantes escritoras portuguesas de literatura infanto-juvenil.

Pode ler (aqui) as restantes crónicas de Alice Vieira


 

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